Tempo de Passagem

Entre capítulos perdidos e interpretações que deixaram a desejar, eis aqui dois personagens. Não duvidem de seu amor genuíno, pois é de dar inveja até aos Montecchio e Capuleto. Porém, embebidos nesse traiçoeiro sentimento, ambos se vem em um momento de cheque de valores, prestes a quererem dar um passo adiante.

Fábio: Quero me sentir prioridade
Levy: Mas você já é minha prioridade
Fábio: Quero aquele companheirismo de volta. Aquele que um é o outro, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença.
Levy: E desde quando você não pode contar comigo? Você sabe que eu estou aqui por e pra você em todas as horas.
Fábio: Quero que você me escolha, como eu faço, como quando meus amigos ligam e me convidam e eu recuso com "Me desculpe, mas hoje Levy tem que estudar" ou "Podemos ir só um pouco, porque Levy tem outros compromissos e não vou deixá-lo sozinho". Porque por mais banal, como socorrer um amigo com o carro quebrado, ou outro sem transporte para o seu gás, eu te incluo, e fico triste de você ver a minha impossibilidade e nem por isso deixar. É só remarcar, para que eu possa ir também. Afinal, a vida não termina nesse fim de semana.
Levy: Mas assim você quer me impedir de viver.
Fábio: Não quero te impedir, só queria que você entendesse esse meu valor, pois é assim que eu vejo respeito.
Levy: Eu não te entendo, se eu te trato tão bem, porque tamanha desconfiança?
Fábio: Não é desconfiança, é prioridade.

Altas horas, fortes ventos, quentes febres, cego de uma lembrança atordoante, Fábio se precipita e lança palavras afiadas, facas amoladas, espadas forjadas em desgostoso fogo.

Fábio: Me vejo as voltas do meu antigo relacionamento e não quero que seja assim. Talvez eu te ame em demasia e isso me envenene.
Levy: Como ousas me comparar àquele individuo que te fez tanto mal, se eu te faço tão bem?

Fábio percebe o equívoco insano. Perdido, se sente em um mar de lama, não conseguindo nadar até a margem, preso em seus próprios detritos.

Fábio: Eu não estou te comparando a ele. Mas essa atitude me faz lembrá-lo. Por favor, tente mudar.
Levy: Isso é um ultraje, eu não sou, nem fui nem serei como ele.
Fábio: Você tem razão, é só essa atitude. Mas eu não sei como abrir seus olhos. Você também já sofreu por mim e de maneiras nem sempre convencionais, conseguiu abrir os meus. Agora sou eu que estou aqui, tentando de mostrar a minha tristeza, e você está renunciando a perceber.

Silêncio

Fábio: Eu errei em comparação tão chula e grotesca. Disso me arrependo.
Levy: Não sei se tenho ainda vontade de olhar essa sua face ingrata.
Fábio: Me perdoe, mas tente me entender. Eu te dei a minha vida, mas quero perceber que também sou a sua, em todos os momentos. Eu jamais duvidei das tuas juras, dos teus carinhos e do teu bem querer. Há aqui uma única questão a ser resolvida, a prioridade, que para mim é tão importante quanto o Sol é para a Terra. Se você acha que meu valor é errado, ultrapassado, ou equivocado, me diga. Mas não encerre a conversa por uma comparação pobre e inapropriada, da qual me arrependo.
Levy: Agora eu tenho raiva. Depois nem sei.
Fábio: Eu quero conversar, só isso.

A situação não se resolvera, mas a Páscoa chegara. Em tempo de passagem, Fábio espera que Levy abra o coração e estenda a mão, para que os dois possam atravessar o mar juntos. Isso só acontece meus caros, porque aí existe amor. Essa é uma briga para que o amor vença, não para que ele sucumba, porque quem ama, luta.